Alguns de nossos professores, aqui do Instituto Falasser, gostam de usar a expressão “clínica da delicadeza” para descrever a psicanálise. Que tal nos aprofundar no significado dessa denominação? A etimologia é um campo de estudo da linguística, muito usado na psicanálise, sobretudo lacaniana, que considera o inconsciente uma estrutura da linguagem.
De ἔτυμος ‘verdadeiro, real’ e λογία ‘estudo’, a etimologia estuda a história ou a origem das palavras para explicar seu significado através da análise dos elementos que as constituem. É um estudo surpreendente, que nos abre caminhos para novos e profundos significados, e nos ajudam a ressignificar ideias, paradigmas, crenças e tabus.
Vejamos alguns exemplos, começando pela “clínica da delicadeza”.
Clínica – etimologia
Deriva do grego κλίνη (kline = cama, leito), e successivamente κλινικόσ (klinikos = quem visita um enfermo ao leito). Refere-se a tudo aquilo em que o homem possa repousar, deitar ou se estender. Dessa palavra também deriva κλίνω (klinò, em latim chinare = inclinar-se, dobra-se, curvar-se para a frente).
Fontes: etimo.it + treccani.it
Delicadeza – etimologia
Deriva do latim delicatus, que deriva de delìcere = delícia, significando seduzir os sentidos; que dá, aos diversos sentidos do homem, uma agradável impressão de requinte, leveza; suave ao toque, macio.
Fontes: etimo.it + treccani.it
Clínica da delicadeza – significado
A clínica da delicadeza significa, portanto, inclinar-se para o outro com suavidade, para o despertar de seus melhores sentidos. Esse significado poético me trouxe a imagem de uma bailarina que, ao agradecer, se inclina com delicadeza e reverencia o público. Interessante que, na língua italiana, que também deriva do latim, o artista faz um inchino, pois agradece por si e também por ter despertado no outro os melhores dos seus sentidos.
Inclinar-se é um gesto que fazemos em direção ao outro, quando estamos interessados ou quando queremos ouvir melhor. É uma atitude genuinamente psicanalítica.
Agora vejamos outras palavras que geralmente usamos para definir a psicanálise.
Psicanálise – etimologia
Do grego ψυχή – psyché significa suspiro, sopro, respiro. E porque a respiração é condição do viver, psique significa alma, vida, espírito.
Análise, do grego anàlysis ‘dissolução’, vem de analýo ‘quebro’, composto por anà ‘intensivo’, e lýo ‘eu dissolvo’. Significa o decompor de um todo em seus elementos constituintes.
No caso, psicanálise: analisar a alma, significa decompor a alma em seus elementos mais simples para compreendê-la.
Fontes: etimo.it + unaparolaalgiorno.it
Falar – etimologia
Vem de fabular, do termo latino fabula, que deriva do verbo fari = “dizer, contar”. Fabula indicava originalmente uma narração de fatos inventados. Palavra vem do latim paràbola que também tem a ver com histórias, enquanto ciarlare, de onde se origina a palavra charlatão, nos remete à fala e ao contar histórias fabulosas.
Fonte: origem da palavra + etimo.it
Escutar – etimologia
Escutar vem do latim auscultare, aus (i) cultare, de ausícula (aurícula = orelha). Significa oferecer atentamente a orelha. Ouvir com atenção.
Fontes: etimoitaliano.it
Respeito – etimologia
Respeito é uma palavra interessantíssima para a psicanálise porque, do latim respicere, que é composto por “re-“, ‘de novo’, com specere, que significa ‘olhar’, também ‘olhar de cima’ ou ‘de longe’, ‘ter em conta’, ‘considerar’.
Respeitar significa olhar de novo, considerar, ter uma visão ampla, ter uma visão profunda, investigativa (especular, mesma raiz de specere). A psicanálise é a clínica do respeito e da delicadeza.
Fontes: etimo.it + treccani.it
As palavras podem ter representações várias, muito além do que elas significam. E é a isso, entre outras coisas, que a psicanálise se propõe: ampliar as visões de mundo, os vocabulários e os significados.